Uma História (Parte sete).
Estávamos em um salão na noite seguinte dançando as valsas do Nelson Gonçalves. Um bar incrível, clube Laço de Ouro na cidade de Vaitapaílândia. Começou a tocar Ênio Morricone em dueto com Mina, aquela cantorazinha italiana sem-vergonha. Luciana mudou de humor da água para o vinho e abandonou o recinto. Corri por uns dois quarteirões de rua de terra atrás dela até encontrá-la caída no chão com o vestido todo empoeirado. Tinha tropeçado. Pediu-me que a levasse ao sul, tinha um problema para resolver. Concordei, desde que me explicasse tudo durante a viagem. Fomos ao hotel, apanhamos nossas coisas e saímos na mesma noite. Varamos a madrugada viajando em direção ao sul e Luciana me contou que tinha sido casada com um italiano, sobrinho-neto do homem, do Ênio, e que sabia todas as suas músicas de cor porque passara dez anos de sua vida com elas lhe esquentando os ouvidos. Onde, em que parte do sul, estava o tal italiano? O que ela tinha que resolver com ele? Foram questões que só me vieram à mente quando Luciana adormeceu ouvindo Schumann. Por volta do meio-dia paramos para o almoço e Luciana me disse: uma cidadezinha praiana próxima à Florianópolis. Tinha que pegar a sua divisão de bens que não tinha sido integralmente entregue quando se separaram, o italiano ficara de vender dois apartamentos e isso levaria meses. Luciana, impaciente, sumira antes de qualquer perspectiva de negócio. Tudo bem, eu disse a ela, mas não acha que agora seja muito tarde para reaver este dinheiro? Absolutamente que não, assegurou-me ela, o italiano nunca a procurara porque não sabia do seu paradeiro, e ainda acrescentou que, apesar de se tratar de um homem gordo, flatulento, que arrotava à mesa e tirava tatus monstruosos do nariz, ele era um bom sujeito. O que mais me impressionou foi o poder da música, o tocante azul e poderoso da caixa acústica. Uma simples composição de notas fez minha mulher agir loucamente e lembrar de uma partilha de bens há mais de três anos esquecida. Não fosse o Ênio, nada disto teria acontecido e teríamos continuado nossa jornada ao Mato Grosso, quando então estávamos no estado de São Paulo perto do Paraná, dormindo num motel de luxo torrando todas nossas reservas, pois confiávamos piamente na honestidade do italiano flatulento que nos entregaria de bandeja, assim que chegássemos, uma boa quantia em dinheiro vivo referente à metade do valor apurado na venda dos imóveis. Era lindo como críamos nisso, e nada mais permeava nossas consciências.
(continua).
(continua).
2 Comments:
Garopaba? nunca conheci nenhum italiano gordo ou flatulento por lá. mas quando chegar dê um toque... já pus as cervejas para gelar.
Acho que essa história vai acabar chegando por aqui... Garopaba é pertinho!
Continuo te acompanhando...
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