sexta-feira, novembro 17, 2006

Aspas, Alvarêz Dewïzqe.

Historiadores acreditam que Quinta-feira, 16 de Novembro de 2006, Alvarêz Dewïsqe publicou este conto em seu blogue:
A morte quer passear de trem. Das três garrafas de vinho que havia comprado para passar a noite anterior, havia sobrado apenas o suficiente para encher uma taça, talvez duas, se tivesse sorte. Pegou a garrafa e encheu a taça, mas não teve sorte. Emborcou o vinho de uma só vez, esfregou a mão na boca e deu um arroto. Depois calçou os sapatos e saiu.

Era uma agradável noite de início de inverno. Entrou no fusca e saiu girando pela cidade em busca de um lugar onde beber. Encontrou um bar aberto e encostou.

Dois bêbados jogavam baralho sobre uma mesa, no canto do bar. O rádio tocava uma velha canção de Dylan. Havia uma dama sentada ao balcão, fumando cigarro e tomando alguma coisa parecida com uísque ou conhaque. Realmente uma dama, havia distinção e classe no seu jeito, sua postura, a forma como se vestia. Seus olhos diziam que ela estava mergulhada em algum pensamento, em algum lugar bem longe dali. Ele caminhou até o balcão e sentou ao lado dela.

- O que é pior, a tortura física ou a morte? – Perguntou ela, com os olhos ainda fixos em nada.
- Baby, quem sabe tortura seguida de morte seja a melhor saída. – Sugeriu ele e em seguida pediu uma dose de conhaque para ele e outro para ela.
- Já matou alguém?
- Física e intelectualmente.
- E o que veio depois?
- Um desejo louco de fazer sexo. Quero dizer, não é fácil olhar aquele corpo estirado e não sentir desejo.
- Entendo. – A bebida veio e ela derrubou numa virada. Ele levantou a dele e entornou, também.
Ele reparou os arranhões nos braços dela e perguntou. – O que houve? – E depois virando para o garçom. – Mais duas!
- Bem, nem todos aceitam que a morte é a última estação e acabam relutando para valer antes de serem jogados para fora do trem.
- Ei, você é uma dama de classe, gostei de você, pra valer. – Acendeu um cigarro. - Como se chama?
- Morte. – Respondeu ela, olhando-o nos olhos e sorrindo um sorriso encantador. – Dança essa música comigo?
- Claro. – Respondeu ele, tomando Morte pelas mãos e tirando-a para uma dança.
Quando a música terminou, ela sussurrou ao ouvido dele. – Sexo, sempre mais sexo, tem algum para me oferecer?

Ele pagou os drinques e a levou até o fusca. Saiu e guiou rumo a sua casa. Pularam para cima da cama e se atracaram como dois insanos, esfomeados.

Quando terminaram, ela vestiu-se e ele acendeu um cigarro. Em seguida ela foi até o banheiro. Saiu de lá seis minutos depois.

- Já passeou de trem? – Perguntou ela enquanto tirava um cigarro do maço.

Ele ficou em silêncio. Depois se levantou da cama e apontou um vaso de flores em cima da mesa.
– Sabe que flores são essas? – E enquanto ela se distraía olhando as flores, ele tirou uma pá de detrás da porta e acertou a cabeça dela, em cheio. Ela cambaleou e se ajoelhou. – São lírios! – disse ele acertando a segunda, na orelha. Ela caiu e o sangue brotou. Ele pegou algumas sacolas plásticas e embrulhou a cabeça dela. Limpou o sangue no chão, depois arrastou o corpo até o fusca e jogou no banco do carona. Guiou em direção a ponte sobre o rio que desembocava no mar e atirou o corpo lá embaixo.

Guiou de volta para casa e no meio do caminho lembrou que não tinha nada em casa para beber. Dobrou à esquerda e rumou até o bar onde estivera há alguns minutos atrás.

Os dois bêbados ainda jogavam baralho. Ao balcão uma moça bebia cerveja e balançava a perna direita aflitivamente. Ele caminhou até o balcão e sentou ao lado dela.

- Olá.
- Oi.
- Você parece aflita. – E virando para o garçom. – Uma cerveja!
- Ó, sim, estou aflita!
- O que te aflige?
- Minha mãe.
- O que há com sua mãe?
- Acertei com ela de nos encontrarmos aqui, mais cedo, só que me atrasei. Quando cheguei não a vi, perguntei para o garçom e ele me disse que uma mulher havia acabado de sair com um homem. Ó Deus! Ela é um tanto desmiolada, ultimamente estava insistindo em umas histórias sobre morte e torturas. Tenho medo que ela possa fazer alguma bobagem. Ela é maníaco-depressiva, e não pode ficar sem tomar seus remédios.
- Não se aflija, baby, pode ser que ela esteja por aí, só dando uma volta, arejando a cabeça. – Enquanto isso o garçom punha a cerveja sobre o balcão, e fitava-o enigmaticamente.
- Baby, estou com meu carro estacionado aí fora. Podemos dar um giro pela cidade, quem sabe encontramos sua mãe.
- Mesmo? Você faria isso?
- Vamos nessa. – Pôs uma nota de dez sobre o balcão e saiu com ela, apressado, sem olhar o garçom. Lá fora entraram no fusca e partiram. Giraram pela cidade por vários minutos.
- Ó Deus! Ó Deus! Onde será que ela se meteu!
- Ela está bem, baby. Relaxe. – Calou-se enquanto ela choramingava. Depois sugeriu. – Moro aqui perto, podemos ir até minha casa, te sirvo alguma coisa para beber, para relaxar, depois te levo em casa.
- Ó, você é um anjo! Preciso mesmo de alguma coisa para relaxar.
Já em casa, ele lembrou que não tinha nada para beber e ofereceu um cigarro a ela. Sentaram-se juntos na cama e ele a abraçou. Ela encostou a cabeça no ombro dele e ficou assim enquanto fumava seu cigarro.
Quando o cigarro já estava na cepa, ela se levantou e olhou em volta.
- Que flores lindas! São lírios, não são?
- São sim.
- Acho os lírios tão lindos! São as flores mais belas que existem.
- Fique com esse vaso para você. Leve para sua mãe.
- Ó, não posso fazer isso, você já foi tão bom comigo essa noite.
- Que nada. Leve. Você é bonita como os lírios.

Ela sentou novamente ao lado dele e o abraçou, demoradamente. – Muito obrigado, se anjos existem você é um deles. – Ele sorriu em agradecimento e sugeriu leva-la embora, já era tarde. Ela concordou.

Rodaram até o outro lado da cidade e pararam na esquina da rua onde ficava a casa dela. Ela deu um último abraço nele e beijou seu rosto, em seguida desceu do fusca com seu vaso de lírios nas mãos e seguiu caminhando até em casa. Ele deu a partida no fusca e foi embora.
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Mais coisas podem ser lidas em http://dewizqe.blogspot.com/.

1 Comments:

Anonymous Anônimo said...

lisonjas múltiplas!

2:43 PM  

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