terça-feira, outubro 24, 2006

A Volta do "Tá no perfil".

Publiquei uma história em Julho sobre um corretor de imóveis que dizia tanto “Tá no perfil” que Nós, Eu e meu tio Kibe, o alcunhamos disso. Dia desses algo incrível aconteceu. Veio o Kibe me dizer:

- Alas, ô Kibe, você não sabe quem que eu vi.
- Quem?
- O “Tá no perfil”.
- Hahshah, ele tava corretando casas toscas aos pedaços e dizendo insanidades das mais absurdas para algum candidato à trouxa?
- Não, muito pior.
- O que fazia o Fita então?
- Empurrava um daqueles velhos milionários por jardins gramados da Vila Itaipú, todo vestido de branco, parecia um pai-de-santo.
- Kkkkkkkkk. Ele devia era sendo gigolô do velho, lembra dele contando das fitas dele em Manhattan?
- Lembro! Kkkakak. Ou, aquele “Tá no perfil” é doido, louco, doente, na moral, o cara já perdeu completamente a noção.
- É, um dia o cara é corretor pilantra de casas toscas no além; fala aquele monte de merda, e agora o cara me aparece de enfermeiro. Na moral, é o fim da picada.
- Kkkkkkkkkkk.

Abaixo, o texto do “Tá no perfil”.

“Fomos buscar um corretor de imóveis para ver a casa que meu tio quer comprar. No caminho, ele já me avisava: “cuidado que o cara é meio kibe”. Dei risada e seguimos.Em alguns minutos haveria um sujeito absolutamente cheirado no banco de passageiro do meu carro cuspindo mais insanidades por minuto do que eu faço em um mês.
- Tá no perfil, bora lá, bora lá moço, é por aqui.
- Onde fica a casa?
- É longe moço, mas vai indo, segue reto e tora o pau.
- Cacete, tem terra?
- Tem. Mas vai moço. Hum, você tá no perfil, quem é esse menino, ele tá no perfil?
- Ele é meu sobrinho.
- Hum, eu tenho uma filha de dezesseis anos, e gostosa. Mas você sabe comé qui é né, vai ter que me pagar, e custa caro. Donde cê veio?
- Eu vim do mundo.
- Hum, num fica falando isso pras pessoas não que isso vai vira merda, eu conheço todo mundo aqui, já levei quatorze tiros e estou vivo, olha só, tenho marcas aqui e aqui e ali.
- Que fita.
- Cara, logo meu sobrinho vai se cansar de você.
- Que nada, ele é do perfil, mas vem cá, o jóia, donde você vem?
- Daqui mesmo, cara!
- Como, se eu nunca te vi por aqui?
- Ele passou uns dias em London.
- Ah, hum, speak english? He’s handisomi, handisomi.
- Who’s handsome?
- Moi.- Hum, tá no perfil, bicho, vô ti arranjá um emprego na cultura inglesa, eu conheço a dona, ela é minha parceirona de putaria, gente boa, milhonária, tem vários carros importados, coroa e solteira, se você quiser ainda arranha um biteco. Mas cê sabe comé qui é né, cê vai ter que me pagar e é caro. Cê tem dólar aí? Lá fora é assim, tudo é pago, todo mundo si fodi, intão cê já sabe comé qui é.
- Não.
- Euro?
- Também não.
- Pô, meu, mas tudo bem, cê me paga depois, di outro jeito.
- Não vou te comer, cara.
- Não, não é isso que quis dizer, ai como são bobo essis moço dojindia.
- Diboa.
- Mas olha só, minha filha tem dezesseis anos i é filé, queimou todo o patrimônio do namorado dela com gasolina de carro e pó e ainda fica menosprezando a mesada que eu dô pra ela. Ô bicho, ela é modelo, entra no site dela aí depois, vô anotá qui procê. Gostosa. Mas olha só hem bicho, cê vai tê que me paga.
- Diboa.
- Cê tem carro?
- Ué, olha aí, não tá vendo?
- Ai, mas isso, essa caranga aqui é velha dimais pra carrega meu tisoro, mas tudo bem, eu te empresto o meu carro, mas olha só em bicho, não quero você pegando ela por aí não hem, vai lá pra casa, eu moro num apartamento grande e vocês podem fica tranquilo lá.
- Ah é, mas e o emprego.
- Arranjo procê também, porque cê sabe né, eu só ajudo assim minininho no perfil, bunitinho, e cara, cê é no perfil, cê fala o ingleis britânico, é no perfil, e si brincá ainda come a muié.
- Aiai, tá bom cara.
- Olha só bicho, eu vou fazê um frango xadrez domingo lá em casa procê conhecê a minha filha. Cê gosta de frango xadrez, o bicho? Gosta?
- Gosto, ôpa.
- Intão tá combinado, eu vô ti busca lá na sua casa.
- Mas você nem sabe onde eu moro.
- Mas me fala aí já, oras.
- Não, depois você liga.
- Beleza. Mas vou hem.
- Cara, eu sei comé qui é, eu também já morei lá fora. Ráhhhh, aqui são quatro anos di Manhattan meu jovem, também já fui no perfil. Vivi lá só comendo cú de velha rica, e eu fodia e elas me pagavam e dólar caía. Vivi lá bicho, quatro anos. E era só no viagra também né, o coração pulando qui nem doido e eu metendo, arrebentando aquelas véia lá tudo. É bicho, o sistema é bruto lá fora, cê sabe comé qui é, si num fosse isso, eu num tinha nada hoje. Êta veiarada do dólar, mas era bom hem.
- Aham, você tomava viagra ou cheirava pó?
- Hshshshshs, ô moço, fala issu não, shhshsh. Óia só moço, fala nada disso que eu ti disse tá, nada. Quer uma cobertura? Tá vendo aquela ali, eu tô vendendo, o cara faliu com lavoura e tá vendendo desesperado, só duzentos pila, tem piscina e tudo mais. E aquela ali? Ô bicho, tô cheio de cobertura pra vendê, me fala só o tipo de prédio que te passo. E naquela ali é só filé qui mora hem, cheio de gatinha na piscina, tudo filhinha de papai que não faiz nada o dia intêro, só fodi.
- Cara, eu não tenho grana.
- Ah, mas um dia vai tê, bunito dessi jeito. Olha só bicho, eu vô te empresta meu carro e você vai andá com a minha filha usando óculos italianos e aí tudo essas filhinhas di papai vão te querer, mas você vai ter que fica só com a minha filha, tá entendendo ô bicho, e nada de putaria na rua hem, beleza?
- Beleza cara, agora vai aí, chegamos de volta ao Adelina Rigotti, vai aí cara, falou, abraço.
E nessa viagem alucinada fomos a periferia zero da cidade ver uma casinha basicamente construída que o tal corretor estava vendendo. O cara não parou de falar e falar em um único segundo. Eu e meu tio concordamos em unanimidade sobre a condição ‘pozística’ do cara. Foi surreal, absolutamente surreal.Quando digo que sou um centro convergente de acasos desfacetados de vaidade, não é por acaso”.