quarta-feira, julho 26, 2006

Os dias todos iguais.

Vou à escola de bicicleta ouvindo uma bela canção. Uma somente porque quando a canção acaba, eu já estou no pátio do colégio cadeando minha bicicleta. As manhãs são gostosas e macias. Há nem o frio nem o calor. Há o frescor. Passeio pelas ruas cheias de árvores e tenho delírios idílicos. São ruas largas e belas e floridas, embora de certa forma secas por causa da estação. Pedalo e não me canso. As ruas são planas e lisas, tenho medo apenas dos carros nas poucas ruas de trânsito que atravesso. Mas venço-as todas ouvindo I Want You But I Don’t Need You.

Na sala de aula há ninfetas deliciosas, com quem flerto olhares que me tiram a concentração. Droga, preciso me dedicar e aprender o que o professor fala. Os pés, as unhas bem-feitas, os peitos durinhos sob a camiseta branca do uniforme de uma escola de freiras já conheço muito bem. Divido a apostila com a minha colega ao lado, ela é fantástica e eu quero comê-la, embora não tenha jeito para com ela do mesmo modo que ela não tem jeito para comigo. Somos dois tímidos chafurdados na condição de dividir a apostila, e isso é tudo o que temos.

Minha avó viajou e tenho que trocar a água dos cachorros duas vezes por dia e dar-lhes comida. Além de molhar as plantas e observar as pequenas trancas e obsessões chatas que ela inventou. Meus tios vêm me visitar e me ligam para saber se está tudo bem. Sim, está. O Bonifácio vira a sua barriga para cima e fica pedindo carinho. Passo meu pé direito nele e depois acabo rolando e abraçando aquele cão abjeto. Ele é sujo, mas eu não me importo. A Nanica corre desesperada enciumada e mordisca meu tornozelo. Há ninguém na casa senão Nós, eu e os cachorros. Eles latem para estranhos e me protegem porque me amam tanto quanto Eu os amo.

À tarde saio pela rua para entregar um presente de minha avó, procurar emprego, visitar coisas. As mesmas ruas vazias das noites de sábado e domingo se enchem de motoristas estressados e enfurecidos. Brigam comigo e me buzinam devido à minha barbeirice. Não ligo, estou tranqüilamente em comunhão com o mundo. Ainda são ruas vazias, embora cheias de carros e barulho.

Não consigo parar de pensar nas unhas bem-feitas dos pés descobertos de Ana Paula, que é minha vizinha de cadeira na sala do cursinho, e também minha vizinha de casa. Mora coincidentemente ali ao lado. Sua mãe é amiga da minha avó. E quero comê-la. Ela toca na banda da igreja e estuda em uma escola de freiras, como eu e muitos outros infiéis, mas ela não parece ser uma infiel. E eu quero comê-la, em frente aos santos que sua mãe tem para rezar terços do rosário junto com minha avó e as demais velhas rezadeiras. Eu as amo todas. Foram todas bocetas fantásticas um dia, tanto quanto Ana Paula é. E então eu beijaria os santos após tê-la fodido em sinal de gratidão.

Vou à escola em ruas espaçadas pedalando o vento e vendo meninas bonitas. Sinto a plenitude, a grandiosidade. Não tenho saudade de me espremer nos vagões do metrô. Não tenho saudade de ter que correr para pegar o trem das oito e vinte e três. Posso sair às seis e cinqüenta que chego a tempo para a aula das sete. E isso é lindo. Mas sei que não vai durar para sempre e que logo, mais uma vez, vou me cansar de tudo e vou querer mudar, como um eterno insatisfeito enriquecido de tédio.

O Bonifácio late, deve ser alguém chegando. Estou sozinho e nem conheço pessoas para convidar para uma orgia. E também tenho que ir a aula amanhã e a mais um daqueles testes chatos para emprego em escolas de línguas. A vida se abranda, ou se anula, como irei dizer em pouco tempo.

6 Comments:

Blogger Taty said...

esse menino!
quantos hormônios!

bjo

8:59 PM  
Blogger Guilherme N. M. Muzulon said...

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10:13 PM  
Blogger Guilherme N. M. Muzulon said...

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10:16 PM  
Blogger Guilherme N. M. Muzulon said...

Reah! Cara, ele vem da lama e pra lá volta um dia, satisfeito não sei! Garanto!

PS: a lama, porra, fica no último degrau do panteão dos deuses; fica no fim da verossimilhança, na certeza dos espertos, Jerry!

10:17 PM  
Anonymous Anônimo said...

Depois da descrição, só posso consentir seus delírios voltados à fornicação...

4:03 PM  
Blogger Jorge Ferreira said...

belo texto, tiago!...abraco

8:14 PM  

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